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Foto do escritorMaria João Lopes

Glúten - vilão ou vítima?

Atualizado: 10 de abr. de 2020


O glúten é uma proteína vegetal presente no grãos de alguns cereais. A sua composição química é constituída por dois aminoácidos (gliadina e glutenina) que por sua vez são compostos por quatro proteínas principais: globulina, prolamina, albumina e glutenina.

O facto de não estarmos preparados para digerir o glúten é um mito. Levamos muitos anos a adaptarmo-nos biologicamente a este alimento introduzido há cerca de 10 000 anos pelos povos que começaram a semear os primeiros cereais (trigo e cevada). Estudos científicos determinaram que a boca humana contém bactérias simbióticas (mucilaginosa Rothia y Aeria Rothia) que digerem o glúten (tendo em conta que a digestão dos hidratos de carbono começa na boca). Não considero portanto o glúten um vilão, nem um veneno, nem tantas outras coisas que se dizem por aí. Acho que como se passa com tantos alimentos, não devemos abusar, porque tudo tem um lado bom e um lado mau, mesmo o alimento mais saudável consumido em excesso produz no nosso corpo um desequilíbrio.

Penso que o cerne da questão está na manipulação genética que pode estar a sofrer o grão de Trigo, de forma a responder às necessidades massivas da indústria alimentar, alterando as moléculas originais e dando lugar a diversas reacções fisiológicas indesejáveis. Assim como todos os aditivos - emulsionantes, antiaglorarante, agentes de tratamento, espessantes - e fermentos sintéticos que fazem parte do pão dos nossos dias.

No entanto, é certo que algumas pessoas, apresentam efetivamente uma sensibilidade ou intolerância alimentar ao glúten, podendo provocar reacções diversas na pele, dores de cabeça, alergias ou aumento de mucosidade (entre outros); ou nos casos com uma componente imunológica e genética, danos ao nível da mucosa do intestino delgado (doença celíaca) ou lesões na pele (dermatite herpetiforme).

Tanto nas pessoas com sensibilidade intestinal como nas que apresentam intolerância ao glúten, as investigações determinaram que ambas tem algo em comum: a permeabilidade intestinal aumentada.

E o que é isto? Tal como o nome sugere, significa que o intestino está permeável em demasia, ou seja, “permite” a passagem de certas substâncias indesejadas para a corrente sanguínea, elementos que o nosso corpo identifica como estranhos e leva a activação do sistema imunológico, o que criará uma série de sintomas e manifestações inflamatórias em diversas partes do organismo.

O stress, as toxinas e o desequilíbrio da flora intestinal são alguns dos factores que podem aumentar a permeabilidade intestinal.

Em relação às pessoas com sensibilidade ao glúten, quando relatam certos sintomas após a ingestão de pão e mencionam que melhoram quando deixam de comer pão, julgo que é precipitado dizer que o culpado é o glúten, uma vez que a pessoa não comeu glúten, ela comeu um alimento que contém glúten. Vejamos então um rótulo de um pão de trigo com sementes à venda num supermercado:

"farinha de trigo integral, linhaça, levedura, sementes de sésamo, flocos de aveia,

gordura vegetal de girassol, milho, glúten de trigo, soja, emulsionante (E472e, E482);

antiaglomerante (E170), sal, espessante (E466, E415)". agente de tratamento da farinha (E300)"

Hoje em dia encontramos tantas "coisas" no pão que será difícil de termos a certeza que o glúten é realmente o mau da fita! O pão deixou de ser um alimento simples para passar a ser um alimento processado, talvez seja por isso que as supostas queixas do glúten aumentaram.

Mas e quais são os cereais que têm glúten?

Os cereais ricos em glúten são: o trigo (incluindo a Espelta e o Kamut), o centeio e a cevada.

Cereais como o milho, o arroz, o milhete são isentos de glúten. Assim como a quinoa (Chenopodium quinoa), o amaranto (Amaranthus) e o trigo sarraceno (Polygonum fagopyrum), que não são botanicamente cereais, mas que são considerados como tal. Todas estas opções são livres de glúten.

A aveia permanece como um cereal controverso. Alguns estudos apontam que a aveia também possui prolaminas (o constituinte tóxico para os celíacos), mas em menor grau, mas outros afirmam o contrário, sugerindo que a ingestão de aveia é segura. Contudo, ainda que a aveia seja isenta de glúten, esta é frequentemente plantada nos mesmos terrenos e processada nas mesmas máquinas que outros cereais ricos em glúten, podendo ocorrer uma “contaminação”. Para quem não é celíaco, mas deseja eliminar o glúten da sua dieta, a aveia pode ser consumida sem problema.

Para finalizar, quero sublinhar que sou defensora de uma alimentação intuitiva, por isso se suspeita ou sente que os alimentos que contêm glúten o prejudicam, evite esses alimentos, mas não o faça só porque ser "glúten free" virou moda. Ouvir o nosso corpo e os sinais que ele nos dá é fundamental, assim como ler os rótulos, existem pães de boa qualidade no mercado, basta querermos ser consumidores atentos, informados e conscientes.

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